09 agosto 2011

Especialistas avaliam risco que nova classe C impõe ao governo



SHEILA D'AMORIM
DE BRASÍLIA


Os riscos que o surgimento da nova classe C impõe ao governo tomou conta do debate organizado pela SAE (Secretaria de Assuntos Estratégicos) sobre Políticas Públicas para uma Nova Classe Média, nesta segunda-feira, em Brasília.

Eduardo Gianetti, professor do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa) destacou a necessidade de o governo incentivar a educação financeira. "Crédito é um produto perigoso. É fácil algo benéfico se tornar algo ruim se for mal utilizado".

Segundo ele, é comum ver pessoas fazendo "extravagâncias" no crédito. "Isso pode se tornar uma tragédia coletiva, como os países ricos nos mostram agora", completou, referindo-se à turbulência internacional atual, originada numa crise de financiamentos imobiliários, no final de 2008.

Ricardo Paes de Barros, secretário de Ação Estratégica da SAE, destacou que insistir na nova classe média apenas como consumidores tem outro lado, que é a pressão inflacionária e os desequilíbrios nas contas externas. Isso, se a oferta não acompanhar a demanda por bens e serviços e houver aumento de importações.

Renato Meirelles, sócio do instituto Data Popular, focado em pesquisas sobre o comportamento dessa população, rebateu afirmando que foi o consumo da classe C que ajudou o Brasil a enfrentar os desdobramentos iniciais da crise ao longo de 2009 e que, em vez de pensar em frear o consumo dela, o governo deve investir no aumento da produtividade e da competitividade da indústria brasileira como forma de aliviar as pressões inflacionários e por importações, advindas do crescimento.

Segundo ele, o fortalecimento do mercado doméstico permite ao Brasil enfrentar melhor situações como a dos últimos anos. 'Em 2010, somente o 13º. salário da classe D colocou na economia, em um único mês, valor equivalente a 16 meses de pagamento do Bolsa Família. Não existe programa mais eficiente de distribuição de renda do que o aumento do emprego'.

INCONSISTÊNCIAS

A situação brasileira, para Gianetti, mostra várias inconsistências. "A nova classe média quer automóvel, mas temos estradas para atender esse crescimento? Ela quer máquina de lavar, televisores, computador, mas temos geração e distribuição de energia para essa demanda? Viaja-se mais de avião, mas não temos aeroportos. Fizemos o Minha Casa, Minha Vida [programa para construção de moradias populares] e não temos saneamento, que estava na agenda do século 19".

Para o diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, Luiz Awazu Pereira, o Brasil não é excessivamente dependente da conjuntura internacional para crescer e está 'preparado para enfrentar eventos negativos sem perder a sustentação' do modelo atual de crescimento.

No entanto, ele admite que há questões internas que representam grandes desafios ao governo. "A demanda de bens duráveis é atendida por importações. Se isso se prolongar pode gerar desequilíbrio macroeconômico, com impacto sobre a viabilidade da nossa situação externa", disse.

Segundo ele, o governo tem que "responder a isso com a suavização desse patamar de consumo". Pereira defendeu que o endividamento das famílias deve ser compatível com nível de renda delas e que a poupança seja estimulada.

De acordo com o diretor, para dar sustentabilidade ao modelo atual, é preciso não só moderação e prudência na concessão e tomada de crédito, mas também "investir em educação financeira, em infraestrutura", além de "desestrangular setores e dar respostas de competitividade e produtividade" nas áreas pressionadas por um novo patamar de demanda de bens e serviços.

http://www1.folha.uol.com.br/poder/956520-especialistas-avaliam-risco-que-nova-classe-c-impoe-ao-governo.shtml