Olhando apenas para a atividade econômica, o município de São Desidério parece uma ilha de prosperidade no extremo oeste da Bahia.
A intensiva produção de algodão, soja e milho faz a cidade, de 28 mil habitantes, se orgulhar de ter a segunda maior produção agropecuária do país, e o 112º PIB per capita (soma de bens e serviços produzidos, dividida pelo total de habitantes) entre os 5.564 municípios brasileiros.
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Indicador econômico não reflete desenvolvimento com clareza; veja análise
Essa aparente riqueza, no entanto, não se traduz em bons indicadores sociais.
Tal contradição se repete em municípios onde a riqueza é gerada por empreendimentos industriais ou lavouras de exportação que concentram renda e criam relativamente poucos empregos.
De acordo com o Censo de 2010 do IBGE, 30% da população de São Desidério, por exemplo, vive em domicílios com renda média per capita inferior a R$ 70, linha de miséria do governo federal.
Comparando o PIB per capita, o município está entre os 2% mais ricos do país. Analisando a miséria, figura entre os 20% mais pobres.
Uma análise feita pela Folha nos indicadores sociais dos 200 municípios de maior PIB per capita mostra que São Desidério não é um caso isolado. Em 30 dessas cidades, a proporção de brasileiros vivendo com menos de R$ 70 per capita fica acima da média nacional, de 9,6%.
A maioria desses municípios é de pequeno porte, mas concentra grandes empreendimentos, o que explica que o PIB per capita seja elevado.
Entre as características mais comuns deste grupo estão atividades ligadas à indústria de petróleo (dez casos), cultivo de soja ou grãos (oito) e hidrelétricas (cinco).
Segundo Júlio Miragaya, economista do Conselho Federal de Economia, essas atividades geram muita riqueza, mas empregam pouco.
José Ribeiro, economista e demógrafo da OIT (Organização Internacional do Trabalho), concorda: "É importante desmistificar a ideia dos grandes empreendimentos como agentes exclusivos do desenvolvimento".
Sheila Zani, responsável pelo cálculo do PIB municipal do IBGE, faz outra ponderação: nem sempre a riqueza gerada é absorvida pela cidade. "Muitos dos empregados mais qualificados moram em grandes centros, onde a é renda absorvida."
Se não há necessariamente geração de emprego local, algumas dessas cidades ao menos deveriam se beneficiar de arrecadação maior. "Mas a gestão municipal não consegue reverter o montante expressivo de impostos na melhoria das condições de vida", diz Ribeiro, da OIT.
Em São Desidério, é fácil entender por que o PIB não se traduz em bem-estar. Há grandes fazendas com lavouras mecanizadas. Os donos moram em outras cidades e chegam de avião. A riqueza fica na mão de poucos e vai para fora da cidade.
http://www1.folha.uol.com.br/poder/951982-miseria-persiste-em-30-das-200-cidades-com-pib-mais-alto.shtml